Luiz Felipe divide com seus leitores todos os desenlances de sua jornada, suas aventuras e frustrações fora do seu país.

terça-feira, 6 de abril de 2010

Luneta do Bem / Luneta do Mal








—Será o engano infantil na vida...—Aceito!—Será a credulidade insensata.—Aceito!—Será a inocência indefesa. — Aceito!     —Será a zombaria do mundo e a cegueira da razão. —Aceito!*

Ah, visão do bem! Que adoramos ter sobre as coisas de fora enquanto criticamos avidamente o que temos. Afinal de contas, a grama do vizinho é sempre a mais verde, não é mesmo?  O texto que escreverei hoje talvez choque alguns dos meus leitores. (Que prepotência),  porque talvez por entre os textos eu tenha passado uma imagem errada sobre mim e nas coisas que eu acredito.
É muito complicado contar experiências novas e descrever um assunto detalhadamente sem parecer que exista um grande sentimento de adoração por o que se descreve. E é o que ficou parecendo. Não adoro os Estados Unidos. 








Tirando algumas exceções não penso que seu povo tenha criado grandes obras culturais. Acho desprezível o que a cultura do medo e a cultura do American way of life fez com as pessoas que moram lá, sinto pelas mentes afetadas por tanto lixo cultural e sinto por tantas outras que acabam pagando (sem saber) para que hoje exista uma potência como aquela.
Enfim, o objetivo hoje é questionar sobre as lunetas mágicas que muitas vezes são postas frente aos olhos de muita gente. Uma coisa é viajar, ficar impressionado com algo e outra é negar de onde você vem e abominar suas raízes. O que me arrepia é o hábito de idolatrar um país, uma cultura, sem conhecer os seus podres. Quando as pessoas pensam em estar nos  Estados Unidos elas pensam que as coisas serão como nos seriados ou nos filmes que lotam os nossos cinemas.
George Constanza é um perdedor porque aos trinta, mora com os os pais, não tem emprego, é gordo e careca. Seu amigo Jerry Seinfeld é um ótimo partido porque é rico, engraçado e por algum motivo as mulheres sempre gostam dele. Mais da metade dos seriados apresentam pessoas que não tem que se preocupar em trabalhar, não tem grandes objetivos, se preocupam unicamente com o que está em sua volta e só. Além de ensinar como as pessoas devem viver suas vidas, como devem se vestir e como não pensar por si só e confiarem e si mesmas.
O que me preocupa é até onde isso vai. O quanto desses valores acaba impregnado em nossas mentes? Será que fomos doutrinados a ter um ideal de amor? De romance? De comédia? De casamento? De felicidade? De certo? De errado? Se a nossa realidade for diferente do que está nas telonas ou telinhas não vai valer?
Além da grande indústria visual, todos elogiam o país como um todo, educação, grandes avanços, essas coisas.
Sabe o que os Estados Unidos ainda não tem? Um sistema público de saúde, educação pública superior e vários avanços que a nossa legislação tem.
Mas é claro, é sempre mais fácil criticar tudo o que é brasileiro...

—Será a tua próxima convicção de que é melhor ser cego, do que ver demais.—Aceito.—É o mal.—Aceito.—É o gelo no coração!—Aceito.—E o ceticismo na vida!—Aceito.—Por que, criança?...—Porque eu quero ver.—Verás demais!—Aceito.*

Ah visão do mal que adoramos prestar a tudo o que possuímos. Dá pra imaginar isso: O que Cuba, França, Inglaterra e Brasil tem em comum? Se você sofre de alguma doença você pode ser atendido nesses países sem pagar nada. Nos Estados Unidos isso não acontece. Se você estiver nos Estados Unidos com a garganta inflamada e quiser tomar uma benzetacil. Você vai sair decepcionado. Primeiro porque para ser atendido na emergência você teria que pagar e segundo porque nossa injeção favorita é proibida por lá. Enfim, essa não é a questão.
A questão é que uma vez eu torci o braço e tive medo de ter quebrado, daí fui até uma clínica,o raio x durou segundos, a consulta durou 5 minutos e saí com uma conta de 3 dígitos. Sério. Mais de 100 doláres. Se fosse no Brasil eu provavelmente esperaria mais tempo, mas seria da mesma forma, tudo igual, menos a conta. Eu demorei pra me dar contar de que eles não tinham essa realidade. Ficar doente, passar mal necessariamente levava a perder dinheiro, e muitas vezes ficar devendo e em certos casos, ir a falência.  Não digo que o Brasil seja ótimo, existem muitos, mas muitos problemas, mas pelo menos uma chance há.
Em outro tópico: A lenda é que quando uma criança nasce os pais fazem uma poupança para custear a faculdade. Andei procurando algumas informações: Para se estudar em Yale (uma das faculdades que os seriados e filmes sempre criticam) por um ano os pais desembolsam uma quantia de 49,000 dolares. Isso sem considerar gastos pessoais e morando no campus na universidade. Faculdades particulares são caras. A verdade é essa, mas no Brasil você tem uma chance de estudar sem pagar nada, tudo bem que o sistema pode ser corrompido e quem acaba entrando são as pessoas que tem dinheiro. Mas a chance existe.
Mais uma coisa: Nos Estados Unidos não existe nenhum auxilio trabalhista como dispensa durante o casamento para os noivos, ou tempo para a  lua de mel, auxilio creche, eu me pergunto se existe o 13 salário. Titio Getulio esteve por aqui não é mesmo.   Bom eu poderia passar muito tempo falando o que tem de um lado e não tem de outro. Mas eu prefiro terminar de outro jeito.
Uma linha imaginária. É isso que separa um mexicano de um estadounidense. Uma linha batalhada que não existe. Um consenso que define quem fica com o dinheiro, tecnologia e cuidados e quem passa fome, luta e paga as contas. E ainda falam bem das coisas que só existem em nossas mentes.  


*Trecho de A luneta Mágica, de Joaquim Manuel de Macedo 

3 comentários:

Ana Flávia Lucas disse...

Nunca deixei de pensar que os EUA são o país mais colonizado - em todos os sentidos que isso possa ter - do mundo. A mediocridade de certas atitudes oriundas de lá, só fazem eu querer ser mais brasileira (opa! eu tenho uma nacionalidade adjetivada...)

┼Nyte Shade┼┼Lady Janiffer┼ disse...

Bom o que posso dizer além de que as pessoas sempre se desfazem do que teem, por algo que veem sem ao menos saber se é tudo aquilo mesmo. Assim ficam facinadas, as vezes até alucinadas por algo que na realidade não conhecem e vivem um grande ilusão até que se percebem que tudo tem dois lados, que nem tudo é bom demais que não haja nada de mal, assim também nada é ruim demais que não se possa ter algo de bom também...

Unknown disse...

Teteco, concordo com você que nós, brasileiros, poderíamos olhar para o nosso país com mais admiração. Segue abaixo um interessante trecho do artigo do embaixador Alexandre porto sobre a autoestima brasileira:
"Entre os 192 membros que hoje tem a ONU, o Brasil é a nona maior economia. É um dos maiores produtores de alimentos. Conta com indústria diversificada. Não apresenta problema de endividamento externo. Tornou-se credor líquido de recursos. Tem autossuficiência energética. É o sexto maior fabricante de automóveis e vende aviões mundo afora.
O Brasil não nega sua condição de país em desenvolvimento. Tampouco ignora os desafios importantes na esfera social que deve enfrentar e vencer. Os brasileiros sabem que seu país é uma obra em construção e que, como povo, têm a aprender sobre a própria diversidade. No entanto, no contexto internacional, por qualquer ângulo que se olhe, o Brasil se singulariza.
O mundo admira o Brasil. Os brasileiros, relutantemente, dão-se conta disso. Percebem que a lógica de superioridade não se sustenta. Redescobrem a autoestima. Firma-se entre eles a consciência de que a diversidade lhes abre possibilidades mais amplas do que os estereótipos inferiorizantes da ideologia colonialista permitiriam antever"

 
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